Lugar de repórter é na rua?
Passei um mês escrevendo a coluna política do jornal, cobrindo férias. A primeira vez em que tinha assumido o posto foi em 2007. O editor chefe de então me orientava, num tom entre recomendação e bronca: "Não fique na redação. Vá para a rua tomar um café com a fonte".
Nove anos depois, não há mais com quem "tomar café" (aliás, nunca tomei, para evitar a construção de uma proximidade excessiva, muito perigosa para um jornalista na hora de formar juízo. Fonte não é 'amiga': é fonte, por mais consideração que se possa ter a ela enquanto gente).
Nesse período, a maioria das fontes não morreu. Mas não está mais na rua. Era comum, ao circular pelo Centro de Santos, onde fica a Prefeitura -- e, até há alguns anos, o mesmo prédio abrigava as sessões da Câmara --, encontrar um bocado de gente, tanto em caminhadas quanto em grupos na Praça Mauá ou, mais especificamente, no famoso Café Carioca (aonde políticos graúdos vão comer pastel por conta da casa quando vêm aqui anunciar projetos que nunca se concretizam).
Neste mês, as andanças resultaram em quase nada. Saí duas vezes à rua, em horários de grande movimento, e achei duas pessoas. E que abordaram o mesmo assunto, mais de cunho histórico do que de política atual.
Hoje, as pessoas com quem se pode falar estão cada vez mais ao celular. Nem sua voz se ouve tanto: há situações em que é mais fácil mandar mensagem de texto pelo WhatsApp do que esperar que o interlocutor atenda à ligação.
Para mim, o aguardo pelos dois risquinhos azuis confirmando a leitura e, na sequência, pelo texto da resposta, gera ansiedade ainda maior do que ouvir o sinal de 'chamando' ao telefone. E o interlocutor pode, até, ver o recado, mas nem sempre responde. É a 'caixa postal' contemporânea, até que seja substituída por outra forma de contato ou de recusa em atender.
Não é de hoje, mas, à medida que a tecnologia avança e dependendo do assunto que se cobre (neste caso, política, e quando não é dia de sessão legislativa ou de solenidades), o lugar do repórter vai sendo em aparelhos que se tornaram a extensão de seu corpo. Um tipo diferente e menos humanizado de contato.
Esse é um sentimento de quem começou na profissão 'analógico' e vai, aceleradamente, se 'digitalizando': o da saudade do tempo em que a rua era mais representativa e decisiva. Hoje, é tudo organizado demais. A ponto de não sabermos, às vezes, se quem responde é a fonte ou um profissional designado por ela.
O que será (e de que jeito será) daqui a nove anos?