segunda-feira, 20 de julho de 2009

Não tem preço

Acabo de chorar. Um jornalista, que vive a se perguntar intimamente por que veio ao mundo — afinal, diz ele, não pediu para nascer —, não acha a resposta. Conforma-se desta maneira:


“Já que (o autor da pergunta) veio, faz jornalismo. É a melhor profissão para quem não consegue ser outra coisa na vida”.


A tal dúvida não é só dele, mas o autor da conclusão que me emocionou (e não venha me dizer que essa sensibilidade é coisa de você sabe o quê) é Geneton Moraes Neto, pernambucano viciado na profissão desde 1970. Você já deve ter lido seu nome nos créditos do Fantástico, na Rede Globo, do qual foi editor-chefe duas vezes.


O mesmo Fantástico que, três semanas atrás, veiculou matéria sobre a venda de diplomas universitários (e de níveis inferiores também) falsos. Que “lembrou” A Tribuna de uma pauta já prevista, mas que, por algum motivo, não foi executada antes. E que, enfim, virou reportagem, publicada no domingo que passou.


Três mil reais, em duas parcelas, por um diploma de curso superior — foi o que ouvi de um certo Jaime, ao me fazer passar por interessado no negócio. Fiz-me de desesperado, pedi uma força. Consegui dez por cento de desconto e estender o valor de duas para três prestações. “Dedicação total a você”, diria um garoto-propaganda das Casas Bahia.


Claro, não queria diploma nenhum. Já tenho o meu, guardado num envelope timbrado, no armário do quarto, para raríssimas ocasiões. Veja só que bonito, imponente, sóbrio, colossal, extraordinário, impressionante. Em papel especial, com caracteres góticos. Feito para um bacharel.



Custou quatro anos de idas e vindas, de doze a catorze horas diárias de trabalho, noites sem dormir (tinha vezes que ia faculdade para o emprego e, de volta, para a faculdade, sábado de manhã, para a imperdível aula de Problemas do Homem Contemporâneo, sem parar para pensar que vivia o meu — trabalhar muito, ganhar pouco e não me sobrar nada) e um investimento, em valores atualizados, de uns 40 mil reais.


Hoje, esse pedaço de papel, que era indispensável para quem quisesse exercer a profissão, não custaria nem os três mil que o farsante me cobrou. Recuso-me a dizer o quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) afirma que vale.


Alguém poderia sugerir que, diante dessa situação, eu me reinventasse (palavra desgraçada, essa) e procurasse algo mais lucrativo e seguro para fazer.


Não dá. Estou na “melhor profissão para quem não consegue ser outra coisa na vida”. Não sei se seria “outra coisa”. O jornalismo é uma das melhores escolas para quem não se especializou em nada, mas é levado a descobrir de tudo um pouco e, ao raciocinar e explicar isso às pessoas, ajuda a melhorar o que está à volta.


É de chorar. Porém, não adianta. Se tiver que derramar lágrima alguma (e por mais piegas que pareça), que seja pela satisfação incontida de ainda me sentir útil no que faço. Algo que tem muito valor. Mas não tem preço.

2 comentários:

Nando disse...

Opa, tem preço sim: mil e oitocentas ducas. Tá no holerite.

Rafael Motta disse...

Isso não é preço: é o que pagam pra gente, e olhe lá. Se cobrasse mais, talvez fosse substituído por alguém que aceitaria menos. E, como diploma para jornalista deixou de ser vantagem, o salário só tende a cair.