sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Os "armazéns" dos irresponsáveis

Escrevo a dois dias das eleições de domingo (3/10). Resultados à parte, fica a constatação que os grandes veículos nacionais de comunicação jogaram fora a oportunidade de mostrar serviço público em benefício do eleitor. Atuaram contra a sociedade, ao se deixar levar por oportunistas que, às autoridades, desmentiram o que teriam dito à imprensa.

Ficará para sempre a frase da presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito, pela qual, diante de uma incompetente oposição política ao Governo, cabe à imprensa assumir esse papel. E o fez – mal, ao se valer mais de ilações do que de fatos e quase que impedindo o contraditório, como costumam agir os maus políticos.


Aliás, a declaração da dirigente da ANJ tem contexto histórico diferente desta, de Millôr Fernandes, muito lembrada por quem defende os delitos de informação da mídia: “Imprensa é oposição; o resto é armazém de secos e molhados”. Na ditadura militar, era preciso se opor ao cerceamento das liberdades. Entretanto, sobraram armazéns de papel e via satélite naquele tempo.


Se a imprensa ainda se considera realmente formadora de opinião, deveria evitar a oposição sem discernimento. Os presidentes da República dos últimos 16 anos viram-se diante de desconfianças legítimas (por exemplo, quanto ao destino do dinheiro das privatizações e à presença de figuras suspeitas na Casa Civil), mas também sofreram com opositores irresponsáveis que buscaram apenas a luz dos holofotes e as manchetes dos jornais.


Óbvio: empresas (e os grupos de comunicação o são) têm interesses particulares e, às vezes, inconfessáveis. Mas, em meio à relativa liberdade de imprensa que temos, é desfaçatez vender jornais envoltos numa aura de isenção e oferecer o contrário nas bancas e aos assinantes. Divulgar preferência política em editoriais não exime os veículos que o fazem de agir com honestidade.


Têm sido tão evidentes as posturas desonestas da grande imprensa que a
Folha de S. Paulo se deu o trabalho de produzir matéria de página dupla, recentemente, para dizer que cobriu de modo crítico não só os atos do atual governo, mas vem agindo assim desde a redemocratização. Passou recibo.

Colunistas e articulistas também são pegos de calças curtas quando gastam seus dias a tentar provar aquilo que não têm ou deixaram de lado, temporária ou definitivamente: o senso crítico em qualquer situação, não só em benefício de determinados partidos políticos e candidatos.


O pior é não ter razões para acreditar que, apesar da descompostura e do destempero, a grande imprensa será melhor daqui para a frente. Que seus donos perceberão não valer a pena se desfazer daquilo que julgam ter – credibilidade – em nome de projetos políticos para tão poucos.


Também não dá, neste instante, para crer que a disseminação da internet, sozinha, será a salvação para os males causados pela imprensa. Grandes grupos na web são atrelados a velhos conglomerados familiares, e não são todos os sítios e blogs “independentes” que, em seu papel contestador, aceitam ponderações.


Já se sabe perfeitamente o que fazer em defesa de um jornalismo correto. Mas, a persistir nessa toada, chegará o dia em que a maioria, consciente das manipulações da mídia, passará a considerar a imprensa um negócio dispensável. E isso respingará nos jornalistas, reduzidos ao desprezo há muito tempo reservado à classe política – na qual se incluem os opositores irresponsáveis.

2 comentários:

Nando disse...

Os jornais estão morrendo, Rafa. O JB foi o primeiro, mas não será o único. Felizmente. Monopólio da informação atrapalha o desenvolvimento de qualquer nação.

Com todos os seus defeitos, o Governo Lula tem esse mérito. Conscientemente ou não, fez o véu da imprensa cair. E ela mostrou como sua cara é feia.

Andrea Rifer disse...

Se tem uma coisa que a grande imprensa perdeu faz tempo é a credibilidade. Eles estão desesperados!