quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A devida qualidade

Lideranças políticas da Baixada Santista, em especial de Santos, afirmam que há um desafio a superar com a iminente exploração da camada pré-sal: "Manter a nossa qualidade de vida".

Nada disso. Temos de RECUPERAR a qualidade de vida que perdemos. O que é um grave indicador de como ficará esta região daqui a poucos anos: se nós, que podemos nos virar, estamos passando por isso, será cada vez mais difícil oferecer condições minimamente decentes aos pobres (e os nem tanto) e miseráveis de nossas nove cidades.

A promessa de riqueza trazida junto com as futuras operações petrolíferas em águas ultraprofundas já serve de pretexto para que o 'mercado' torne esta região ainda mais desigual e excludente.

Como muitos construtores acreditam numa invasão de trabalhadores bem remunerados da indústria do petróleo a Santos, os preços foram às alturas. Para 2011, a Prefeitura já avisou que aplicará parte dessa valorização nos lançamentos do IPTU. Por isso, tenha certeza de que os aluguéis, já estratosféricos, irão aumentar.

Quem só vê derivado de petróleo em posto de gasolina ou no botijão de gás e não possui casa própria na cidade seguirá sem tê-la. Será expulso da Terra da Caridade (que ajuda cada vez menos) e da Liberdade (menos a de ser santista).

Voltando à tal qualidade de vida, dinheiro não traz felicidade. Ainda em Santos: o orçamento municipal para o ano que vem está estimado em quase R$ 1,5 bilhão. Em relação ao que está projetado para este ano, será um crescimento de 12%. É mais do que o dobro da inflação oficial do País no período (5,2%). Isso sem considerar os quase R$ 30 milhões a mais que a Prefeitura deverá arrecadar com o reajuste do IPTU.

Santos tem transporte coletivo de qualidade? O trânsito municipal, como vai? Quem não dispõe de plano de saúde pode ir sem medo a um pronto-socorro ou a uma policlínica? Acabamos com as favelas e os cortiços?

O secretário estadual da Habitação, Lair Krähenbühl, admite estar perdendo a guerra para o 'mercado': não se consegue competir com o poder econômico das construtoras. Mas não se consegue porque as prefeituras, principalmente, não fazem sua parte na delimitação dos espaços de suas cidades. Certas zonas TÊM DE SER reservadas para habitação popular. Mas um município empurra o problema para o outro.

Imagine que você é um antigo morador dos bairros-cota de Cubatão. Chega lá alguém do Governo e lhe diz: "Olhe, você vive em Cubatão, estuda em Cubatão, trabalha em Cubatão, tem posto de saúde e transporte em Cubatão, parentes e amigos em Cubatão. Só que a gente quer reflorestar a Serra do Mar e você vai ter de COMPRAR um apartamento da CDHU, com 45 metros quadrados, pagando prestações por até 25 anos. Mas não é em Cubatão: pode ser em Peruíbe, Itanhaém, São Paulo. E mais: você não será indenizado".

Eu fico pensando o que responderia um classe-média reacionário, xenófobo e crítico de qualquer programa social (Bolsa Família, ProUni) se lhe fosse apresentada uma 'proposta' como essa.

Acredite: existe gente desse nível governando estados e prefeituras. No caso da Baixada, os políticos com poder de decisão não passam aperto. Eles não vão sentir o ardor do pré-sal, porque o Estado está aí para ser aparelhado.

Qualidade de vida depende muito da qualidade da classe política. Dois mil e dez já era. Mas 2012 vem aí -- o que não é lá grande coisa, quando se veem os pré-candidatos que começam a aparecer.

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