segunda-feira, 29 de abril de 2013

Desafio: permanecer jornalista


“Qualquer um pode ser jornalista”. Não é uma frase motivadora, no sentido de despertar vocações e estimular pessoas talentosas a exercer a profissão: é a realidade. Que futuro pode ter uma função para a qual não se exige nada além de ler e escrever –e fazê-lo corretamente é o de menos?

O presente é este aqui, no qual se oferecem vagas a jornalistas “com experiência” para trabalhar, “de segunda a sexta, das 9 às 19h, por R$ 800,00”. Não dá 1,2 salário mínimo nacional (R$ 678,00). Ou, como já vi em um site, um real por texto em um site de turismo.

Leitores pouca coisa mais atentos do que o convencional percebem que os jornais de papel estão encolhendo. É difícil dizer que esteja acontecendo assim porque o público quer. O mais correto é que as empresas de comunicação, assumindo cada dia mais a porção “empresa”, enxugam tudo.

Isso ocorre no mundo todo. Neste link (http://www.careercast.com/jobs-rated/best-worst-jobs-2013) mostra-se a realidade – ao menos, a verdade deste site – de 200 profissões nos Estados Unidos. Repórter de jornais impressos (que tendem a desaparecer, diz um analista) está em último lugar.

Por que está na rabeira? Porque paga pouco, o nível de estresse é elevado e não há perspectiva de crescimento nas contratações de profissionais do tipo, ainda segundo a pesquisa.

Esse levantamento também mostra que o sofrimento é generalizado na área de Comunicação. Editor de jornais e revistas aparece na 168ª posição (ou entre as 50 piores); radialista, na 184ª; e fotojornalista, na 188ª.

E não adianta apelar para a ficção ou para biografias, pois a vida de escritor também está com mais de 50 tons de cinza: 156ª colocação.

Se parte dos bons profissionais não se sujeita à semiescravidão e, entre os poucos que restam, estão aqueles que aceitam qualquer coisa para se manter no emprego – ou para tomar o lugar de quem já está ali –, não dá para acreditar que reestruturação alguma garantirá qualidade mínima aos jornais.

Nem qualidade nem senso crítico. Já faz um bom tempo que profissionais de linha (ou nem tanto) descobriram que o antigo alvo de sua fiscalização se tornou um excelente filão profissional: o poder público. Como criticar um empregador em potencial e lhe pedir socorro mais tarde?

O trabalho jornalístico está desvalorizado. Nas maiores empresas de comunicação locais, o salário de um repórter permite a ele se inscrever em programas habitacionais do governo, por exemplo. Na Câmara de Santos, um assessor parlamentar recebe quase o dobro – cerca de R$ 4,5 mil líquidos.

Ser jornalista é uma coisa. Permanecer jornalista como se deve ser é outra, bem mais difícil.

Um comentário:

César disse...

Caro Rafael,
Historicamente, jornalista sempre ganhou mal. Me refiro principalmente a quem carregava o piano. Exceção para quem afinava o instrumento e sempre soube escolher a música para agradar e ser bem recompensado. Hoje, Rafael, me entristece é ver a maior parte da classe desunida, sem espírito de camaradagem, sem visão crítica, sem bagagem cultural, mas sobrando deslumbramento, egoísmo e subserviência. Como mudar? Não sei, confesso. Mas eu gostaria de contribuir.

Parabéns por tocar no assunto, Bigode. Abração.