terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Submersos

Perto de fazer 60 anos, meu pai nunca tinha passado por algo que acompanhou durante décadas enquanto repórter-cinematográfico: ver a própria casa se encher de água, em São Vicente.

A chuva produziu uma 'piscina' com quatro dedos de altura dentro de onde mora. No entorno, tudo inundado. Ele e os vizinhos estão ilhados; ninguém entra, ninguém sai. Impossível ir trabalhar hoje.

-- Filho, isso é porque São Vicente é a primeira [cidade fundada no país]. Se fosse a última...

E não é a única. Todos aqui devem ter visto o efeito do temporal em ruas, casas, nas estradas. Mas já choveu mais forte outras vezes. Foi mais água do que no mês todo, mas no mês não havia chovido quase nada.

É um desastre. Ninguém morreu, mas tudo o que implique impedir gente de até mesmo sair de casa é um desastre. E possíveis emergências? Um parto? Um enfarte? Como trabalhar?

Esse desastre estava 'no forno' e é o resultado de dois 'ingredientes' altamente 'calóricos', não necessariamente nesta ordem: parte do povo é porca, no asfalto e na favela; e temos governos estúpidos, insensíveis.

Não pode ser normal um governo que asfalte todas as ruas que vê, em especial na orla, e não pense que isso não vá deixar o solo menos impermeável (aonde a água vai escoar?) nem entupir bocas de lobo.

Não pode ser inteligente uma administração que libera a construção civil para fazer o que quiser. Em Santos, o concreto é o principal motivo de entupimento das galerias pluviais. Chove pouco, alaga muito.

Deve ter piorado algo que o colega Flávio Leal e eu constatamos em reportagem de 'A Tribuna', há cinco anos: 20% da população da região vivia em áreas sob risco de inundações, deslizamentos de terra e incêndios.

Porque não pode ser justa uma prefeitura que deixa correr a invasão de áreas irregulares por ser incapaz de se acertar com outras esferas de governo e criar condições dignas de moradia para seu povo.

Esta tal região metropolitana também está, no sentido figurado, debaixo d'água. Ninguém entre os que têm poder político para defendê-la faz da regionalização e das soluções conjuntas sua bandeira.

A inundação de estradas, por onde passam todo dia milhares pessoas impedidas de morar em uma cidade e obrigadas a trabalhar em outra, é um símbolo muito interessante do que aconteceu com a metropolização.


Você conhece algum político cuja casa foi invadida pela água da chuva?

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