sábado, 17 de agosto de 2013

A agonia do jornalismo porra-louca

Acabou -- ou quase. Desculpe pela expressão, mas o jornalismo 'porra-louca' está agonizando. Os jornalistas desajustados, aqueles que ignoram horários fixos de trabalho e não conseguem passar o cartão de ponto exatas quatro vezes ao dia (uma na entrada, duas no intervalo e uma na saída) bem poderiam entrar numa lista do Ibama de espécies em extinção.

Não que eles (ao menos, nem todos) tenham deixado de ser assim. As redações é que não os aceitam. Está cada vez mais difícil encontrar um 'porra-louca' nessa vastidão de gente arrumada (também por dentro?), de bons modos e perfeitamente adaptada ao verdadeiro 'novo jornalismo': aquele que se faz com acúmulo de funções e sem possibilidade de hora extra, exceto em casos extremos.

Eu, talvez infelizmente, sou dos mais formais. É meu jeito e assim sobrevivo há 20 anos. Mas eu sei muito bem que está nos rebeldes com conteúdo -- e não em gente mimadinha, ativista de sofá e que jamais tomou um ônibus, ainda que por curiosidade -- aquela fagulha de criatividade que pode transformar uma edição trivial na maravilha que o consumidor de informação quer ver.

Do contrário, os jornais, revistas, tevês, rádios e sites estão, todos, presos a um modelo de produção que mais tem a ver com uma fábrica de linguiças do que com empresas jornalísticas. Jornalismo é ciência humana; a humanidade é diversa; conviver com a diversidade nos faz conhecer outros pontos de vista, ouvir a música e dançar conforme o ritmo -- ou rejeitá-lo, desde que sabendo do que se trata.

Por mais competência técnica, criatividade e leitura que possa ter um jornalista 'sério', e mesmo que um profissional assim ainda vá para a rua de vez em quando, não há como desprezar as reportagens fora do comum que somente pessoas inquietas e que recusam a escravidão do relógio de ponto podem, até, imortalizar.

É dessas reportagens que surgem as histórias incríveis que se contam, de geração para geração, entre os profissionais da notícia -- os bastidores que reanimam a vontade dos mais velhos (ou ainda os nem tanto) e estimulam os que estão chegando agora a fazer algo diferente, inusitado. A ter vontade de viver esta profissão tão especial em sua origem e, agora, burocratizada por quem não entende dela.

O que os jornalistas hoje perto de terminar a faculdade ou que acabaram de concluí-la terão, em suas vidas, para contar aos colegas que estão para nascer?

Como redações cada vez mais raquíticas, onde o número de profissionais às vezes nem atinge o mínimo necessário, poderão continuar a oferecer algo indispensável, inusitado, surpreendente?

Às vezes eu me pergunto quem foi o 'porra-louca' que, um dia, acordou pensando que menos é mais, convenceu donos de empresas jornalísticas e, depois disso, se tornou um profissional bem remunerado -- ganhando mais do que poderia sonhar qualquer jornalista, ajustadinho ou nem tanto, que não alcançasse nem a fama nem o sucesso das 'estrelas' da tevê.

Um comentário:

Sérgio de Barros disse...

É Rafael, se o jornalista ficar preso dentro da redação vai ser limitado o material para noticiar e fazer denúncias. Mas acho que dependendo das características de cada profissional, este confronto com a realidade pode ser fácil ou muito complicado.