terça-feira, 21 de outubro de 2014

Baixada Santista vira o novo 'Circuito das Águas'

Texto originalmente publicado nesta terça-feira (21) na seção Papo com os Editores, do jornal 'A Tribuna', de Santos (SP)

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(Observação prévia: a ironia é um recurso de linguagem destinado a tornar a crítica mais aguda. Pode motivar francas gargalhadas ou risos nervosos. Neste último caso, serve para externar a indignação de quem vê e sente os efeitos de situações difíceis de explicar sem cair no ridículo. Esse esclarecimento se faz necessário porque, em período eleitoral, há assuntos delicados sobre os quais não se consegue conversar civilizadamente, pois a temperatura dos debates não permite. Então, que fique claro: o início do texto contém ironia. Ponto, parágrafo.)

Ao transferir o Circuito das Águas do Interior para o Litoral, o Governo do Estado dá impulso a um gênero turístico inédito: o roteiro da sede. Também surpreende incontáveis nordestinos que fugiram da seca e aqui viram, pela primeira vez, “a água que sai da parede” (torneiras e chuveiros).

A abundância não mais existente se agravou por uma seca previsível e cujos efeitos poderiam ter sido minimizados. Passada a eleição para governador, a direção da Sabesp admitiu que a potencial gravidade do problema era conhecida há pelo menos dois anos.

Mas, antes de avisar a população com insistência, para não deixar dúvida de que se tratava de uma catástrofe próxima, a Sabesp se dirigiu em primeiro lugar à Bolsa de Nova Iorque. Informou, em primeira mão, acionistas da empresa sobre a crise no sistema Cantareira.

Um levantamento do Instituto Datafolha mostrou, nessa segunda-feira (20), que dois terços dos paulistanos pretendem estocar água. Eles recebem água do Cantareira, que está quase seco. E, como mostra hoje (21) 'A Tribuna', milhares têm viajado de São Paulo para o Litoral em busca de água.

Hotéis lotados, estradas intransitáveis, tráfego irritantemente lento comprovam que os fins de semana da temporada de verão estão sendo antecipados. Quem vive na região e sofre para circular dentro dela em períodos considerados normais pode tirar do armário seu estoque de paciência.

E essa antecipação tem tudo para trazer, mais cedo do que sempre acontece, problemas no abastecimento de água na Baixada Santista. Sobretudo em Praia Grande e Guarujá, cidades para onde mais acorrem turistas em períodos de férias e os canos ficam secos do Natal ao Ano-Novo.

A memória faz lembrar que, em 27 de dezembro passado, a presidente da Sabesp, Dilma Pena, afirmou termos “a garantia do abastecimento da região pelos próximos 30 anos”. Isso foi dito após a inauguração de duas estações de tratamento de água, em Guarujá e Itanhaém.

Menos de 30 horas depois, o que se viu foi um Réveillon a conta-gotas. É o que geralmente ocorre quando a população fica muito acima do normal, sabe-se disso. Mas, à medida que a crise em São Paulo se agrava, a Baixada deve se preparar para viver isso mais frequentemente.

A população também tem culpa. Por isso, o Governo Estadual deveria parar de brincar de pagar bônus a quem economiza (uma obrigação) e começar a multar quem desperdiça água. A eleição já passou; o governador não perderá votos agora. Terá mais quatro anos para mostrar a que veio.

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